25 de janeiro de 2018

Aos interessados em 2018, convém levar em conta a pouco conhecida maldição presidencial

25/01/2018 - A chance considerável de Lula ser preso após ser condenado em segunda instância inclui o petista no rol dos presidentes brasileiros com vidas marcadas por infortúnios.

Olhando em retrospecto, a maioria daqueles –e daquela– que chegaram ao cargo público máximo do país acabou, uma hora ou outra, dando-se mal.

A frequência é tamanha que cabe sugerir a existência de uma maldição dos presidentes, ideia que certamente só não encontra maior eco por carecer de qualquer rigor científico. (Não me esforçarei aqui para convencer aqueles que, de forma muito compreensível, repudiam minha análise sobrenatural dos fatos)

Lógica à parte, vamos aos elementos que dão força à tese de que maus ventos rondam a chefia do Poder Executivo federal.

Com seu dramático suicídio, Getúlio Vargas é o exemplo máximo deste mal.

Depois dele, tivemos os problemas de saúde e o afastamento de Café Filho, a renúncia de Jânio Quadros e o golpe que derrubou e exilou João Goulart.

JK, que parecia que sairia incólume após benquista presidência, acabou tendo o cargo de senador cassado pela ditadura militar (bom texto a respeito aqui). Foi pressionado a se exilar e, de volta, teve a vida devassada por investigações que em nada dariam. Como se não bastasse, morreu em um acidente de carro em 1976.

A SINA DOS ELEITOS

De Getúlio para cá, entre os eleitos pelo voto popular, só se salvaram de derrubadas, punições judiciais e outros contratempos Eurico Gaspar Dutra e –até agora– Fernando Henrique Cardoso.

Além dos já citados, encontraram maus destinos Collor e Dilma, derrubados pelo impeachment.

Os que chegaram ao poder sem ter sido eleitos diretamente para o cargo tiveram mais sorte, casos de Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Figueiredo, que apesar de tudo que se deu em seus governos, concluíram suas presidências e não foram importunados posteriormente nem por clamores político-jurídicos nem por mortes terríveis.

Também não enfrentaram a aparente sina presidencial os inicialmente vices Itamar Franco e –até agora– José Sarney e Michel Temer.

Mas para mostrar que a maldição parece não poupar os indiretos, urge lembrar de Castelo Branco, morto em acidente aéreo após deixar a presidência; Costa e Silva, vítima de derrame cerebral que o tirou do cargo e o matou pouco depois; e Tancredo, que nem conseguiu tomar posse.

VELHA ESPERANÇA?

Nosso recorte pós-getulista já indica números suficientemente alarmantes para os interessados em registrar candidatura em 2018.

Dos 19 citados, 11 tiveram destinos nefastos e 8 deles escaparam.

Os negacionistas da tese do cargo amaldiçoado talvez mirem a República Velha, apostando que os tempos oligárquicos protegeriam mais nossos mandatários.

Enganam-se.

De 13 da época, só 3, bem ou mal, foram poupados: Prudente de Morais, Campos Sales e Venceslau Brás.

Primeiro presidente, Deodoro da Fonseca foi forçado a renunciar após tentar um autogolpe, morrendo menos de um ano depois.

Após uma tumultuada presidência, seu sucessor, Floriano Peixoto, com saúde bastante debilitada, também morreu nos meses que se seguiram a sua saída do cargo, com apenas 56 anos.

Rodrigues Alves foi vitimado pela gripe espanhola antes de assumir seu segundo mandato presidencial.

Afonso Pena padeceu de uma pneumonia fatal durante o mandato.

Delfim Moreira alternava momentos de lucidez com insânia, pouco governando na prática. Foi outro a morrer menos de um ano após deixar a presidência.

Hermes da Fonseca passou meses na cadeia, já ex-presidente, após se envolver na revolta tenentista. Solto, morreria naquele mesmo 1923.

A sorte também não sorriu para Washington Luís, preso e exilado pelo movimento de 1930; Artur Bernardes, que também seria detido por se opor a Getúlio; Júlio Prestes, eleito e impedido pelos revolucionários de tomar posse; e Epitácio Pessoa, que, ex-presidente, perdeu o mandato de senador pós-1930, desencantou-se com o novo regime, afastou-se da política e morreu com mal de Parkinson e problemas cardíacos.

SALVAM-SE OS REIS?

Voltando atrás mais algumas casas, para o Império, o mau agouro é ainda mais regra.

Dom Pedro 1º foi forçado a abdicar ao trono brasileiro, protagonizou uma guerra civil em Portugal e morreu com 35 anos.

Seu filho, Pedro 2º, foi mais longevo e teve um reinado mais estável, mas acabou por ser derrubado pelos republicanos e banido do país, morrendo no exílio aos 66.

Somados os dois regimes, decerto resta inconclusiva a hipótese de que uma maldição assola nossos líderes.

Os mais racionais se exaltarão, dizendo que a profusão de trajetórias conturbadas se deve mais às personalidades dessas figuras e às estruturas nacionais do que à minha tese mística.

Pode ser, pode ser.

De todo modo, insisto: talvez não tenha sido uma boa ideia construir um país sobre um cemitério indígena. Fonte: Folha de S.Paulo.

23 de janeiro de 2018

DIAGNÓSTICO DE PARKINSON LEVA NEIL DIAMOND A DESPEDIR-SE DOS PALCOS


23 jan 2018 - O músico anunciou o cancelamento de todos os concertos do mês de março.

Neil Diamond foi recentemente diagnosticado com a doença de Parkinson - notícia avançada pelo mesmo, através de um comunicado oficial.

O músico, que se preparava para uma tournée na Austrália e Nova Zelândia para celebrar dos 50 anos de carreira, viu-se obrigado a cancelar todos os concertos do mês de março.

“É com grande relutância e desilusão que anuncio o cancelamento dos concertos”, disse o artista. “Estou muito honrado por ter dado concertos para o meu público nos últimos 50 anos. As minhas sinceras desculpas a todos os que compraram bilhetes e planeavam ir aos espetáculos”, destacou.

Nel revelou ainda que pretende “continuar ativo na escrita, gravações e outros projetos durante muito, muito tempo”.

“O meu agradecimento para todo o meu público leal e dedicado em todo o mundo. Vão ter sempre o meu apreço pelo vosso apoio e encorajamento. Este caminho foi ‘tão bom, tão bom, tão bom’. Obrigada”, acrescentou. Fonte: Life Style Sapo.

21 de janeiro de 2018

Morre o chef Paul Bocuse, o “papa” da gastronomia francesa

Ele já tinha a doença de Parkinson e partiu em sua casa

20 jan 2018 - O chef Paul Bocuse, conhecido como o “papa” da gastronomia francesa, morreu aos 91 anos. A informação foi compartilhada neste sábado (20) pelo ministro francês do Interior, Gérard Collomb, no Twitter.

Paul Bocuse faleceu em casa, onde também fica seu renomado restaurante, em Collonges-au-Mont-d’Or, perto de Lyon (centro-leste da França). Ele já sofria da doença de Parkinson.

“Paul Bocuse morreu, a gastronomia está de luto, o Sr. Paul foi a França, a simplicidade e a generosidade, a excelência e a arte de viver, o papa da gastronomia nos deixou”, postou Collomb, ex-prefeito da cidade natal de Bocuse, em Lyon. Fonte: Claudia. Veja mais aqui: Paulo Bocuse, o 'papa' da culinária francesa, não tinha papas na língua.

12 de janeiro de 2018

Raúl Zurita, o poeta que escreveu no céu e jogou amônia nos próprios olhos

12/01/2018 -
RESUMO
Celebrado nos EUA e nunca publicado no Brasil, o poeta chileno Raúl Zurita vem ganhando prestígio no mundo literário hispânico. Protagonista de episódios de automutilação e atuante na resistência à ditadura de Pinochet, ele faz poesia árdua que enlaça vida e obra, oscilando entre as perspectivas pessoal e coletiva.

"Meu Deus é fome".
"Meu Deus é paraíso".
"Meu Deus é câncer".

Em Nova York, a 5.000 metros de altura, cinco aviões traçavam 15 versos do poeta chileno Raúl Zurita nos céus do Queens, cada um deles esticados ao longo de seis quilômetros. Naquele azulado 2 de junho de 1982, o poema "La Vida Nueva" passava a competir com as nuvens. Zurita, concentrado nas manobras das aeronaves, ignorava a reação dos pedestres no distrito novaiorquino.

"La Vida Nueva" não era um poema solto no ar: aplacava um ciclo de desespero pessoal no Chile. Em 11 de setembro de 1973, no golpe militar encabeçado por Augusto Pinochet, Zurita —então com 23 anos— foi preso no estádio de Playa Ancha, em Valparaíso, e depois transferido para o cargueiro Maipo, onde por 21 dias ficou espremido no porão com outras 800 pessoas.

O militante comunista fascinado pela "Divina Comédia" conheceu o inferno dantesco da tortura.

"O golpe de Estado é, para mim, quase uma definição artística e política. Esse fato é o principal de minha vida, marca a minha existência a fogo. Até o ponto de quase decidir que todo livro meu teria a ver com isso", explica Zurita na sala de sua casa, em Santiago. Diante dele há um quadro com o rosto de Kafka desenhado pela artista catalã-chilena Roser Bru.

O poeta e professor de literatura nascido em 1950 tem olhar ameno, barba irregular e pequenos espasmos nas frases emocionadas. Há 17 anos ele enfrenta o mal de Parkinson, doença descrita sem autopiedade: "A mão se arrebenta e você não vê, a cabeça vai pro lado, tem posturas estranhas. É forte".

Vencedor do Prêmio Nacional de Literatura do Chile, em 2000, Zurita é um dos mais influentes escritores chilenos contemporâneos, com prestígio crescente no mundo hispânico, embora desconhecido dos leitores brasileiros.

Ele se recorda apenas da tradução para o português de três partes de seu livro "Anteparaíso" (1982) feita pelo poeta amazonense Thiago de Mello, seu admirador, na antologia "Poetas da América de Canto Castelhano" (publicado pela Global).

No final de 2017, Zurita levou à galeria Isabel Aninat, no bairro de Vitacura, em Santiago, a videoinstalação "Verás un Dios de Hambre" [verás um deus da fome], uma prévia da projeção noturna de 22 versos nas escarpas da costa norte do Chile, no encontro do Pacífico com o deserto de Atacama.

Na sala escura, a voz em off do poeta acompanha as imagens tomadas de helicóptero: "Verás cidades de água/ Verás céus em fuga...".

Zurita entende o projeto —concebido em 2002 e agora perto do fim— como uma metáfora de sua morte, por iniciar-se no crepúsculo. Não será a sua primeira poesia visual no deserto. Em 1993, já durante a democracia, fez com que retroescavadeiras inscrevessem a frase "Ni pena ni miedo" [nem dor nem medo] numa extensão de 3.140 metros no Atacama.

VIDA E OBRA
O poeta americano John Ashbery (1927-2017), vencedor do Pulitzer de poesia em 1976, definiu a obra de Zurita como "acidamente cruel e, finalmente, libertadora".

Nascido em Santiago, Raúl perdeu o pai aos dois anos e atravessou uma infância pobre com a família materna, de origem italiana, influenciado sobretudo pela avó Josefina Pessolo, contadora de histórias extraídas da "Divina Comédia", de Dante Alighieri.

Estudante de engenharia e membro do Partido Comunista, Zurita assistiu à derrocada de Salvador Allende em Valparaíso, onde residia na altura do golpe. Sob a ditadura Pinochet, ele integrou o Coletivo de Ações de Arte (Cada), formado com o sociólogo Fernando Balcells, os artistas Lotty Rosenfeld e Juan Castillo e a escritora Diamela Eltit (sua ex-mulher).

Seus dois primeiros livros, "Purgatorio" (1979) e "Anteparaíso", conferiram força à sua entrada na poesia chilena.

Com um estilo próximo do neobarroco, Zurita partiu, de uma obra a outra, da perspectiva pessoal para a coletiva, enlaçando vida e obra. A capa de "Purgatorio", por exemplo, traz uma foto do escritor com uma atadura na lateral do rosto queimado a ferro.

"Tive um episódio humilhante com os militares, que me levaram arbitrariamente [em maio de 1975]", conta o poeta. "Eram os reis da coisa. Não me fizeram nada. Depois de quatro horas, saí em plena rua com os braços na nuca. Senti tal humilhação acumulada que me recordei da frase de Cristo de que se baterem em sua face direita, ofereça a outra. Então saí, me fechei num banheiro e queimei a minha face."

"Mas não foi uma performance. Porque não foi com fotógrafo. Não gosto de performance. Foi o ato de um desesperado, absolutamente solitário, sem saber bem por que estava fazendo. Era significativo para mim mesmo", ele continua. "Minha vida estava totalmente destroçada. Se não me suicidei é porque era redundante e ridículo suicidar-se num país que estava matando gente."

Em março de 1980, numa nova tentativa de automutilação, jogou amoníaco puro nos olhos, sem conseguir cegar-se. Queimou as pálpebras e uma parte do rosto, lesionando de leve as córneas.

Para suportar a penúria, imaginava coisas impossíveis, como um poema escrito por aviões, concretizado depois em Nova York. "Ampliar os limites da poesia é o que menos me importa", ele avisa e, contrariando a crítica, compara a ação aero-poética à busca dos povos antigos por respostas no céu.

Na Índia, durante a Bienal Kochi-Muziris de 2016, Zurita apresentou a instalação "The Sea of Pain" [o mar da dor], onde os visitantes molhavam as canelas num galpão inundado de água salgada, para ler nas paredes os versos dedicados à crise humanitária dos imigrantes: "Você não me ouve?/ No mar da dor.../ Você não voltará,/ Nunca mais,/ No mar da dor?".

"Sinto que toda a arte, toda a literatura, todas as sinfonias compostas, são os restos de uma batalha cósmica perdida. A tarefa não é escrever verso, nem pintar quadro, nem fazer poema concreto. A tarefa é fazer da vida algo decente. Nós, os chamados artistas, não somos mais do que aves necrófagas que vão traduzindo os escombros de uma batalha perdida", lamenta o poeta.

"É como se nunca tivéssemos saído de Homero: 'Canta, ó deusa, a cólera de Aquiles'. O primeiro verso da Ilíada. Em certo sentido, ainda estamos na época de cólera do poema homérico."

CHILE

Atualmente casado com a escritora Paulina Wendt, ganhou duas antologias recentes, "Tu Vida Rompiéndose" (Ed. Lumen) e "Verás" (Ediciones Biblioteca Nacional), este último lançado ano passado, na sequência do recebimento do Prêmio Iberoamericano de Poesia Pablo Neruda de 2016. Zurita inclui Neruda (1904-1973), vencedor do Nobel de Literatura de 1971, entre suas altas admirações.

"Em 'Canto Geral' (1950), Neruda é como a 'Divina Comédia'. As críticas ao 'Canto Geral' são absolutamente parciais e ideológicas. Em 'Alturas de Machu Picchu', Neruda não é um ser humano. É outra dimensão. Está possuído por uma língua, por uma história. Depois de 'Canto Geral', fez coisas que não valem muito a pena. Mas, quando Neruda era Neruda, em 'Residência na Terra' (1933), não havia obra tão bonita", argumenta.

Impregnado de paisagens rudes e áridas do Chile, o poeta conheceu o deserto de Atacama em 1982. Na viagem de ônibus, despertou com o azul intenso do céu, pressentido num poema escrito cinco anos antes: "Os desertos de Atacama são azuis". Zurita acha difícil racionalizar a presença maciça de rios, penhascos, desertos, praias e cordilheiras na obra de um homem urbano.

"Agora tenho algumas teorias, mas não sei", ele especula. "Sinto que tudo tem um pouco a ver com o golpe de Estado no Chile. Porque nunca me importou a paisagem. Quando veio o golpe, em 1973, começaram toda a coisa patrioteira das canções nacionais. Pensei: qual é o Chile? Pablo de Rokha, Pablo Neruda, Gabriela Mistral, Vicente Huidobro, Violeta Parra, Nicanor Parra, Gonzalo Rojas, Víctor Jara, ou o país desses cantos fascistas? Qual é? Creio que foi a luta pelo significado. O que significa a cordilheira dos Andes?".

Os focos conservadores da sociedade chilena continuam a preocupar Zurita, que, na campanha presidencial de 2017, gravou uma mensagem de apoio a Alejandro Guillier, o candidato de centro-esquerda derrotado por Sebastián Piñera, de centro-direita.

"No golpe, foi brutal a irrupção da violência. Se tem mitificado que não havia isso. Não é certo. O Chile teve duas guerras, com o Peru e a Bolívia [entre 1879 e 1883], e depois se dedicou à guerra contra os mapuches. Finalmente os dominaram com o Exército. Na história há matanças contra populações operárias. Por um lado, há uma história de democracia entre aspas e de uma grande poesia. Por outro, há uma história de massacres, golpes, revoluções, caudilhismos. Era algo que nós conhecíamos. Uma violência que estava e prossegue", defende.

As memórias da ditadura lhe conduzem a uma expressão sombria e agitada. "Todos os assassinos e torturadores —Pinochet, Hitler ou Stálin— não nasceram no planeta Vênus. Nasceram na mesma cidade, na mesma rua em que estou", diz ele, inconformado com a apuração incipiente dos crimes dos militares.

"As mentiras são tão fortes quanto os assassinatos. Um país que mente sobre a ditadura é um país não solidário, egoísta, arrivista, individualista".

Os horrores políticos não esfriaram Zurita. "Então, espremendo a face queimada/ contra os grãos ásperos deste solo pedregoso/ -como um bom sul-americano-/ elevarei minha cara ao céu por um minuto mais/ chorando/ porque eu que acreditei na felicidade/ voltarei a ver as irrefutáveis estrelas", diz no "Poema Final".

No desfecho da conversa, uma síntese: "Minha utopia é a construção do paraíso na terra". E, com um andar premeditado e abrupto, o poeta cruza o jardim verdejante entre a casa e a rua. Fonte: Folha de S.Paulo.